INTRODUÇÃO
Na tradição teológica protestante a santificação é distinta da justificação e da regeneração. Todas elas têm a mesma raiz e não podem ser, de facto, desligadas. Enquanto o termo justificação diz respeito à declaração jurídica de Deus pela qual o pecador é declarado justo, e em consideração ao que Cristo fez por ele, a santificação é o seu efeito, a sua execução eficaz. O termo regeneração é confinado ao acto inicial eficaz pelo qual a nova vida é transmitida ao pecador e resultante na sua conversão, da qual a santificação é conhecida como o seu desenvolvimento progressivo.
A visão Pelagiana ou Racionalista
exclui completamente a acção do Espírito Santo e faz da santificação nada mais
do que um conjunto de acções correctas, incessantes, produzidas pelo poder
natural do agente moral livre através do qual vence as más tendências da sua
natureza e constrói um carácter santo. Nesta visão o indivíduo é perfeito enquanto
obedecer às leis de Deus na medida das suas capacidades naturais, tendo em
conta que, nesta visão, a lei moral é uma escala de valores que varia consoante
a capacidade do indivíduo.
A visão medieval ou Católica-romana
recusa a distinção da justificação e santificação e torna ambas as
purificadoras do pecado pela infusão de hábitos da graça pelo Espírito Santo
instrumentalizadas pelo baptismo, pelo qual a mudança subjectiva remove a culpa
e o favor divino é condicionalmente outorgado. É um processo progressivo e
ganho através das boas obras que possuem mérito real, granjeando um incremento
da segurança graciosa. Segundo esta visão ritualista, a perfeição consiste na
perfeita conformidade com a lei de Deus mediante hábitos religiosos, na
pertença à igreja institucional através do ritual do baptismo e na obediência à
hierarquia eclesiástica.
A visão mística da santificação
deprecia a dependência da revelação objectiva da Palavra, a necessidade dos
meios da Graça enfatiza a intuição espiritual o valor regulador do sentimento
religioso, a comunhão física da alma com a substância divina, e condiciona a
alma na passividade e quietude, na expressão anglo-saxónica “Let go and let
God”.
A visão clássica reformada e
evangélica propõe a dependência contínua da alma das acções graciosas do
Espírito Santo após a regeneração. Através da Graça, o Espírito Santo torna a
alma sua cooperadora na operação da santificação numa acção igualmente contínua,
através dos meios da Graça, internos tais como a fé e da vontade regenerada, e
externos como a pregação, oração, sacramentos, comunhão dos santos. Neste
processo o Espírito gradualmente completa a obra iniciada na regeneração sempre
com a cooperação do crente. É o desenvolvimento, ou incremento, do princípio da
vida espiritual implantado que infunde hábitos da Graça até à perfeita estatura
de Cristo. É um efeito espiritual e moralmente transformador que afecta o
crente no seu todo, intelecto, afeição, vontade, alma e corpo. Trata-se de um
género de visão Católica-romana modificada.
Esta última visão propõe a
doutrina segundo a qual a santificação, apesar de fazer parte da salvação na
obra consumada na cruz, sendo por isso posicional, é igualmente progressiva e
incremental, durando toda a vida do crente, em maior ou menor grau, até à
glorificação. É semelhante à teoria católica-romana do incremento da
santificação progressiva, com a diferença de que nesta última as obras são
meritórias, ao passo que na Reformada e evangélica as boas obras provêm da
acção do Espírito, mas sempre em cooperação com o crente cuja vontade é
regenerada.
DEFINIÇÃO DOS TERMOS
No AT As palavras bíblicas
referentes a santo no hebraico são “qôdesh”, que significa “afastamento”,
“distanciamento” ou “sacralidade”, e “qadosh”, que significa “sagrado” ou
“santo”. No respeitante a Deus, e teologicamente,
a santidade de Deus significa que Ele é total e inteiramente separado de toda a
criação e do mal”. A santidade de Deus é um atributo metafísico e moral.
Refere-se à sua singularidade moral absoluta como também à sua separação total
de todas as criaturas. Em certo sentido, a santidade é um atributo global de
Deus que o distingue de tudo o mais que existe. O substantivo “qôdesh”
(santidade) e o verbo “qadash” (santificar) significam simplesmente o “colocar
de parte, separar para o uso divino, consagrar, dedicar”, termos encontrados na
literatura secular como separar pessoas e coisas para serviço à deidade. No NT estes
termos são traduzidos pela palavra grega hagios que significa “íntegro”, “correcto”,
“justo”, “santo” ou “pio”, o substantivo hagiasmos “santidade” e o verbo hagiazo
“santificar”.
No NT, a santificação é parte da
salvação, mas distingue-se da justificação. A primeira é o trabalho interior do
Espírito Santo que salva do poder do pecado, o segundo a declaração legal sobre
a posição relativamente à Lei. Deve-se observar que o nome do Espírito Santo é
assim atribuído não porque seja mais santo do que o Pai ou o Filho, mas pelo
seu ministério relativamente à salvação é a santificação. Ademais, tentar
perceber ou definir os diversos aspectos da salvação é como tentar adivinhar
onde começa um oceano e começa o outro. Resumidamente, a santificação, segundo
a doutrina protestante tradicional, pode ser compreendida nas seguintes formas:
o seu propósito fala do decreto divino eterno; a sua completude: a do povo de
Deus cumprida na cruz, ou seja, a santificação posicional (por vezes chamada
santificação inicial), sendo a posição do crente na sua relação com Deus; santificação
progressiva: associada com a progressão da vida cristã; santificação absoluta,
futura, perfeita, a completa libertação do pecado, mais propriamente a
glorificação.
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